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25 set Artigos

Financiamento de Litígios: Uma Perspectiva Financeira na Resolução de Disputas

Por: Francisco Ferreira e João Casséte 

O Financiamento de Litígios por Terceiros, mais conhecido em inglês como Third-Party Funding (TPF), consiste em uma prática na qual um terceiro alheio à relação litigiosa resolve se tornar o financiador de um dos envolvidos, geralmente o demandante, em troca de uma parte do prêmio do qual o financiado fará jus em caso de procedência dos seus pedidos.

O TPF é comumente empregado em procedimentos arbitrais, devido aos custos mais elevados associados à instauração e manutenção de uma Arbitragem, além da expectativa de que o caso leve menos tempo para ser resolvido, uma vez que os financiadores tendem a buscar previsibilidade em relação ao período de retorno financeiro.

Embora o TPF seja incipiente no Brasil, inexistindo uma regulamentação específica sobre o tema na legislação, algumas instituições arbitrais, como a CCI, a CAM-CCBC, a CIESP/FIESP e a CAMARB, já preveem regras específicas sobre o dever de revelação do terceiro financiador, de modo a garantir a imparcialidade e a independência dos árbitros nomeados para atuar em um procedimento.

Em 2022, essa matéria foi apreciada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que teve que se pronunciar sobre a revelação do financiador. Em primeira instância, o réu informou nos autos que o autor estaria sendo financiado por um terceiro, um fundo de investimentos, e solicitou a exibição do contrato de financiamento, bem como a qualificação de todos os quotistas do fundo. 

O Juízo da 2° Vara Empresarial e Conflitos, com base nas alegações, determinou que o Autor apresentasse o contrato de financiamento. Contra essa decisão, foi interposto o Agravo de Instrumento n° 2153411-63.2022.8.26.0000. Por ocasião do julgamento, a 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do TJSP deu provimento ao recurso para afastar a determinação de exibição dos documentos, entendendo que a simples indicação de qual Fundo de Investimentos estaria financiando seria suficiente. 

Nos termos do Voto Condutor do Desembargador Relator Natan Zelinsch é “totalmente irrelevante a perquirição sobre a identidade dos financiadores das despesas processuais” quando não houver dúvidas sobre a legitimidade da parte financiada ou indícios de abuso de direito de ação. 

O entendimento doutrinário atual alinha-se com a decisão proferida, defendendo que o dever de revelação no financiamento de litígios deve se limitar à indicação da existência do financiamento e à identificação do financiador. No entanto, existe uma segunda camada de discussão sobre o que seria suficiente para atender plenamente ao dever de revelação do financiador.

Tomando como exemplo o caso em análise, um fundo de investimento pode ser composto por várias pessoas que contribuem financeiramente, incluindo indivíduos influentes que podem ter algum tipo de relação ou contato prévio com os julgadores. Embora os investidores geralmente não tenham controle sobre a estratégia do fundo e, consequentemente, tenham ainda menos influência sobre o litígio, é válido questionar se não poderia haver um conflito de interesses nessa situação.

Por outro lado, com relação à desnecessidade de exibição do Contrato, o entendimento foi acertado, dado que se trata de um tipo de investimento de risco, é esperado que os contratos contenham informações sigilosas sobre os envolvidos e, principalmente, cláusulas negociais relevantes que não podem ser reveladas publicamente.

O financiamento de litígios é uma indústria em desenvolvimento no Brasil, compreendida por muitos como um meio de acesso à justiça. Diante disso, é importante evitar imposições excessivas que possam desestimular investidores/financiadores, sob risco de comprometer a continuidade da prática.

 

¹ Regulamento de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (2021) (artigo 11.7)

² Resolução Administrativa n° 18 (2016)

³RESOLUÇÃO N° 6/2019 -FINANCIAMENTO DE TERCEIROS

4 Resolução Administrativa N° 14/20 – Recomendações sobre Financiamento de Terceiros em Arbitragens Administradas pela CAMARB

5 CARDOSO, Marcel Carvalho Engholm. Arbitragem e financiamento por terceiros. São Paulo: Almedina, 2020

CASADO FILHO, Napoleão. Arbitragem e acesso à justiça: o novo paradigma do third party funding. São Paulo: Saraiva, 2017

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