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06 jul Anticorrupção e Compliance Legislação Não categorizado

O Julgamento Antecipado em Processos Administrativos de Responsabilização

Por: Pedro Rezende, Nayron Russo e Patrícia Guércio

Em 2023, a Lei n. 12.846/2013, também conhecida como “Lei Anticorrupção” ou “Lei da Empresa Limpa”, completa 10 anos. Essa lei estabeleceu procedimento específico para a apuração e a punição dos atos lesivos que tipificam, denominado Processo Administrativo de Responsabilização (PAR). O PAR vem sendo amplamente utilizado em face de empresas acusadas de envolvimento em ilícitos relacionados à administração pública, sobretudo em âmbito federal, no qual compete à Controladoria-Geral da União a condução do processo.

A simples existência de um PAR impõe à pessoa jurídica processada relevantes ônus materiais e, principalmente, de imagem, dificultando o acesso a crédito e a novos contratos. Além disso, no caso de sociedades empresárias, o PAR aumenta a percepção de risco do mercado em relação à empresa, dado o risco de multa de até 20% sobre o faturamento no ano anterior à instauração do processo, excluídos os tributos. Em razão disso, não raras as vezes as empresas que se veem diante de um PAR consideram em suas estratégias de defesa a busca por uma solução consensual junto ao órgão processante, visando à mitigação dos danos decorrentes de eventual condenação.

Apesar dos desafios ainda enfrentados, o acordo de leniência é o mecanismo clássico de solução consensual em Processos Administrativos de Responsabilização. Conforme dados da Controladoria-Geral da União, os acordos de leniência celebrados entre 2017 e 2022 resultaram em mais de R$18 bilhões pactuados a título de multa e ressarcimento de danos.

Nova forma de solução consensual para os processos administrativos instaurados com base na Lei n. 12.846/2013 foi criada pela CGU, por meio da Portaria Normativa n. 22/2022, denominada “julgamento antecipado”.

O “julgamento antecipado” consiste em medida por meio da qual a pessoa jurídica admite sua responsabilidade objetiva pelos fatos objeto do PAR e assume compromissos perante a CGU, dentre eles o de ressarcir os danos causados e de pagar a multa, além de dispensar a apresentação de defesa, a interposição de recursos e de desistir de ações judiciais relacionadas ao processo. Em contrapartida, a CGU oferece a atenuação da multa administrativa. O grau dessa atenuação é inversamente proporcional à fase do processo, de modo que quanto mais avançado o PAR menor será a atenuante.

O acordo de leniência e o julgamento antecipado possuem diferenças fundamentais, a começar pela base normativa. Enquanto o acordo de leniência conta com previsão expressa no art. 16 da Lei n. 12.846/2013, o julgamento antecipado em PAR não está previsto em lei, mas apenas na referida Portaria Normativa n. 22/2022, da CGU. Além disso, ao contrário do acordo de leniência, o julgamento antecipado não evita a condenação e não visa alavancar a capacidade investigatória do Estado, mas apenas resolver a situação específica do processo em que é realizado. Como consequência, o julgamento antecipado oferece benefícios muito aquém dos possíveis em um acordo de leniência, veja:

Fonte: Controladoria Geral da União

Ademais, no julgamento antecipado não há previsão de extensão dos efeitos às pessoas jurídicas que integram o mesmo grupo econômico.

A falta de previsão legal e de participação de outras instituições limita a segurança jurídica que se pode esperar do julgamento antecipado, sobretudo quando comparado com o acordo de leniência. Assim, por exemplo, a ausência de participação de outros órgãos de controle no julgamento antecipado, como a Advocacia-Geral da União, o Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União, gera o risco de que a empresa que optar por essa medida tenha que discutir os mesmos fatos em outras frentes e se veja em situação de fragilidade por já ter confessado, perante a CGU, sua responsabilidade por esses fatos.

O desenvolvimento de mecanismos consensuais de resolução de controvérsias junto à administração pública em processos sancionadores é muito bem-vindo e está em sintonia com o art. 26 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Todavia, é necessário sempre levar em consideração as possíveis consequências de cada solução jurídica para além do caso concreto, prevenindo desdobramentos futuros que, na prática, podem frustrar as expectativas do interessado em obter a plena solução da demanda.

Remodal